Você já se perguntou o que acontece quando um empregado doméstico também é solicitado, com habitualidade, a realizar tarefas no escritório de home office do empregador?
Com o aumento do trabalho remoto, essa situação se tornou mais comum, levantando questões importantes sobre a caracterização do vínculo de emprego. As decisões da justiça e os autores do Direito têm discutido extensivamente essa questão, especialmente sobre a possibilidade de acumulação dos vínculos de emprego doméstico e comercial.
Primeiramente, é essencial compreender a diferença entre o vínculo de emprego doméstico e o vínculo de emprego comercial. O empregado doméstico, conforme a Lei Complementar 150, presta serviços contínuos no âmbito residencial do empregador, sem finalidade lucrativa. Já o empregado comercial realiza atividades voltadas para os fins econômicos do empregador, geralmente empresa, mas também podendo ser empregador pessoa física, sendo regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A Justiça tem enfrentado casos em que empregados domésticos também realizam atividades relacionadas à empresa do empregador. Os tribunais trabalhistas adotam abordagens que levam em consideração qual atividade é a principal e a forma como os serviços são contratados e remunerados.
Quando a atividade empresarial se mostra mais importante, a tendência é reconhecer a relação como sendo apenas entre o empregado e a empresa, não sendo doméstica. Isso ocorre, por exemplo, quando o empregado passa a maior parte do tempo desempenhando funções administrativas ou comerciais para a empresa do empregador.
Por outro lado, há situações em que se reconhece a coexistência de dois vínculos distintos, quando em ambos os casos os requisitos da relação de emprego (tratamos sobre isso em artigo anterior) estão presentes. Quando há uma clara divisão das atividades, com o empregado prestando serviços domésticos e, ao mesmo tempo, realizando tarefas comerciais, os tribunais podem reconhecer que existem dois vínculos de emprego. Cada vínculo teria direitos e deveres próprios, de acordo com a legislação aplicável, sendo necessário assinar a carteira, pagar o salário e recolher as verbas em ambos. Assim, o empregado deve ser remunerado separadamente por cada função, garantindo-lhe os direitos em ambas as relações.
Um exemplo ilustrativo é o julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, que analisou o caso de uma empregada doméstica que também realizava atividades administrativas para a empresa do empregador em regime de home office. O tribunal reconheceu a existência de dois vínculos de emprego distintos, determinando que a empregada tinha direito às garantias em ambas relações, com as devidas separações de remuneração e direitos trabalhistas.
Os autores jurídicos também abordam essa questão com profundidade, destacando a importância de distinguir claramente entre as atividades domésticas e comerciais para determinar a correta aplicação das normas trabalhistas. A maior importância das atividades, a finalidade econômica das funções desempenhadas e a forma como o trabalho é contratado e remunerado são aspectos cruciais na análise. Muitos autores sugerem que a solução mais adequada é analisar cada caso individualmente, considerando os detalhes específicos da relação de trabalho para evitar a aplicação genérica de normas que podem não refletir a realidade.
Portanto, a acumulação de vínculos de emprego doméstico e comercial, especialmente quando o empregador realiza atividades empresariais em home office, é uma questão complexa que exige uma análise detalhada. A jurisprudência tende a considerar a maior importância das atividades e, em muitos casos, reconhece a existência de dois vínculos distintos, cada um garantindo os devidos direitos. Os autores reforçam a necessidade de uma abordagem caso a caso para garantir a correta aplicação dos direitos trabalhistas, assegurando que os empregados tenham seus direitos respeitados e os empregadores cumpram suas obrigações legais.
Lembre-se, em caso de dúvida, procure um advogado de sua confiança.
Sobre o colunista: Leonardo Fontes Vasconcelos é advogado trabalhista licenciado, especialista em direito digital, professor de direito processual do trabalho, assessor no Ministério Público do Estado do Acre e membro da Academia de Letras Jurídicas do Acre. Você pode entrar em contato com ele pelo Instagram @leofvasconcelos.