Sou motorista de Uber, sou CLT?

Eis que você é um motorista de aplicativo como Uber, 99, iFood, Cabify ou outra dessas plataformas e começa a ler notícias de que algum motorista conseguiu na justiça o reconhecimento de vínculo trabalhista, obrigando a plataforma a assinar a carteira de trabalho (CTPS) dele.

É natural que você se interesse e queira fazer o mesmo, afinal, poucos gostam de trabalhar na informalidade.

A questão é, como os tribunais estão entendendo isso? Será que é certo você conseguir que a Uber, por exemplo, assine sua carteira de trabalho?

Já lhe adianto que isso não é certeza. Na verdade, essa tem sido uma das maiores confusões e questionamentos na justiça do trabalho atualmente.

O reconhecimento de vínculo de emprego para assinar a CTPS depende de 5 fatores (requisitos) e todos eles precisam necessariamente estar presentes, se faltar um, já não reconhece o vínculo. Vamos entender cada um de maneira muito simples.

Pessoa física: isso é muito simples, para ser contratado como empregado de carteira assinada, precisa ser pessoa física. Pessoa jurídica (empresa) não tem carteira de trabalho.

Pessoalidade: você é que deve ser o empregado que vai lá trabalhar, a empresa não aceita que outro vá no seu lugar. Se a empresa aceitar que você mande alguém no seu lugar, então não há pessoalidade.

Onerosidade: aqui é fácil de entender. Você trabalha e recebe algo em troca. Geralmente um pagamento em dinheiro, mas pode ser um pagamento com coisas também, como alimentos. Se a empresa não te paga nada, então não há onerosidade.

Subordinação: outro dos requisitos que a gente entende tranquilo. Você, como empregado, deve seguir as ordens da empresa, o jeito que ela quer que você faça as coisas, as regras. Embora seja tranquilo de entender, esse ponto pode gerar confusão, como vamos ver mais à frente.

Não eventualidade: esse é um pouco mais complicado. Por um tempo se dizia que se você trabalhasse 3 dias na semana na empresa, então o requisito da não eventualidade estava presente. Hoje a análise é mais complexa, mas, basicamente, o que você deve entender é que durante a semana, mesmo que você não vá todo dia, você está lá com grande frequência, já faz parte das atividades corriqueiras da empresa.

Repito, todos esses requisitos precisam estar presentes para reconhecer o vínculo e assinar a CTPS, se apenas um deles faltar, já não há obrigatoriedade de assinar a carteira de trabalho.

Expliquei isso porque são justamente esses elementos que a justiça do trabalho vai analisar para saber se a plataforma de aplicativo deve assinar a CTPS do motorista ou não. Ocorre que alguns deles podem ser interpretados de maneira levemente diferente por juízes diferentes. E é aí onde nasce o problema.

Alguns juízes do trabalho entendem que há subordinação entre motorista e a plataforma e acabam julgando reconhecendo o vínculo de emprego e condenando a empresa a assinar a carteira do motorista. Mas, há os juízes que entendem que não há subordinação e decidem por não reconhecer o vínculo, logo, não há a obrigação de assinar a carteira de trabalho.

Essa divergência existe entre os juízes e desembargadores do trabalho, indo até os ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Hoje, o TST está dividido entre reconhecer ou não o vínculo. Isso significa que mesmo que você, ou a empresa, recorra, ainda vai existir a possibilidade de a decisão ser tanto pelo reconhecimento do vínculo de emprego, como pela não existência do vínculo.

No ano passado essa discussão chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Por lá, o entendimento tem sido no sentido de não existir vínculo entre motorista e a plataforma do aplicativo. O STF está em fase de decidir isso de uma vez por todas e finalmente pacificar a questão.

Fato é que neste momento, o sistema jurídico brasileiro não garante se a justiça irá ou não reconhecer o vínculo de emprego entre a plataforma e o motorista.

Lembre-se, em caso de dúvida, procure um advogado trabalhista de sua confiança.

Sobre o colunista: Leonardo Fontes Vasconcelos é advogado trabalhista licenciado, professor de direito processual do trabalho, assessor no Ministério Público do Estado do Acre e membro da Academia de Letras Jurídicas do Acre. Você pode entrar em contato com ele pelo Instagram @leofvasconcelos.